segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Rogério Magro
Os 48 Dias de Lumbala


Lumbala Novo e Lumbala Velho ficavam nas margens do rio Zambeze, onde muitos soldados aprenderam a nadar e alguns correram o risco de lá ficar.
No Lumbala Velho estavam os fuzileiros que nos transportavam de uma margem para a outra.

Havia também uma jangada que levava as viaturas militares e uma lancha de desembarque ancorada no meio do rio.
Sempre que não andávamos em operações albergávamo-nos numa Companhia de Infantaria que estava aquartelada no Lumbala Novo e que tinha grandes dificuldades de abastecimento.
Foram 48 dias a comer rações de combate!
O pessoal da "estalagem" nem uma cebola nos cedia (não tinham!) para comermos com o atum da ração.
Dada a quantidade de dias a comer rações de combate, quando chegava a hora de ”arrear a bosta” era um problema!
Aquilo não era bosta, era cimento armado e o pessoal via-se aflito!
O médico detectou que um militar estava com hepatite, solicitou a sua evacuação e mandou proibir o consumo de qualquer bebida alcoólica.
Como, além de passarmos fome, ainda nos tiravam as "cervejolas", resolvemos ir ao meio do rio Zambeze ter com dois marinheiros que estavam na lancha de desembarque e que tinham cerveja a bordo.
Como eram de outra guerra, não chegou lá a proibição e como, para além disso, eram só dois e estavam de relações cortadas, os nossos pedidos de asilo para as "cervejolas" eram sempre bem-recebidos.

Como havia gente que sabia que estávamos ali em situação difícil, alguém foi à caça e trouxeram-nos duas cabras do mato que, após termos conseguido "desencantar" uns quilos de batatas, alguém fez uma espécie de caldeirada.

Durante a noite foi uma correria desalmada, pois toda a gente passava a correr com as calças na mão.
Eu acordei com o alvoroço e estava admirado de não me suceder nada até que, já com o dia a nascer, lá vou eu a correr e a desapertar as calças e lá consegui chegar junto a um embondeiro para "arrear a giga".
O pior é que o dia já estava a começar a nascer e os mosquitos já tinham acordado e saí de lá com a "bunda" toda picada, minha nossa!

Resumindo: As cabras do mato, depois de mortas, devem ter andado muito tempo pelo mato até chegarem ao destino (gandas cabras!) e, então, causaram uma diarreia geral na companhia que ficou com saudades das rações de combate!

As operações foram várias. Já não me recordo dos nomes dos locais por onde andamos, mas recordo-me que fomos a um aquartelamento, junto à fronteira com a Zâmbia, que só era abastecido por héli e que para andarmos 53 kms com as viaturas, demoramos dois dias para lá e outros dois para cá, dada a quantidade enorme de pontes e pontões que se encontravam destruídos.

Havia alturas em que a farda parecia de plástico e eu afirmava que era à prova de bala e vi pela 1ª.vez, ao vivo e a cores, as meias ficarem de pé sozinhas, sem qualquer suporte.

No Zambeze, todos nus, lavávamos as fardas no rio, fazia lembrar a praia do Meco.







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