quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Dálio Magro
Cancioneiro do Niassa

As canções do cancioneiro do Niassa não eram mais do que canções populares (do Fernando Farinha, do Zeca Afonso, do Adriano Correia de Oliveira e de outros) com letras adaptadas. As letras eram mais ou menos como transcrevo a seguir:

1 – O Turra das Minas

O turra das minas
Pequeno e traquinas
Lá vai na picada
E a malta escondida
Na mata batida
Monta a emboscada

O turra passou
A malta esperou
Já toda estafada
E a Berliet
Sempre foi estoirada

Há mortes e feridos
E os mais aguerridos
Somos sempre nós
Vamos pelos ares
Gritando por todos
Até pelos avós

Oh Turras bairristas
Mas pouco fadistas
Já é tradição
Ser para-quedista
Sem tirar o curso
Ai isso é que não

Oh turra das minas
A tua vida agora
É por as marmitas
Pela picada fora

Oh turra das minas
A tua arma soa
Por léguas e léguas
Aqui no Niassa
Onde a guerra entoa
---X---
(letra para a música do Fado ‘Ó Júlia Florista’)
2 – Merda … Merda

Há erva lá na picada
Pisam-na os guerrilheiros
O coração do soldado
Pisam-na os coronéis
E ajudam os machambeiros

Que culpa tem o soldado
de ter raiva à sua sorte
Se vem um filho da puta
que o mete numa farda
e o manda para a morte

E o sr. Brigadeiro
vive muito descansado
Até comprou um balança
Para pesar o dinheiro
Que rouba ao pobre soldado

Quando será Deus do Céu
Que um dia haverá verba
Quando será Deus do Céu
Que um dia haverá verba
Para a malta comer pão
e os xicos merda.. merda
merda …merda
--- X ---
Canção feita em Nampula em 1970.
Inspira-se numa conhecida canção da guerra civil espanhola:
"La hierba de los caminos
la pisan los caminantes
y la mujer de lo obrero
la pisan quatro tonantes
de essos que tienen dinero" (...)
(João Maria Pinto -1999)
http://blogueforanada.blogspot.pt/2004_05_09_blogueforanada_archive.html
3 – Estou Farto Deles

Todos os cabecinhas
Têm as suas caminhas
Com lençol e almofadas

Mas a malta cá no Norte
Já está com muita sorte
Se não dormir na picada

Eles comem em sua mesa
E com decoro e subtileza
demonstram a sua arte

Mas a malta variando
cá continua lerpando
é a ração de combate

Estou farto deles
que da guerra não sabem nada
só chateiam a rapaziada
para fazer um figurão

É descansando
que o tempo vai passando (Ai)
Só estamos esperando
acabar a comissão

Andei cá pelo Norte
Lado a lado com a morte
Lutando sempre na frente

Mas eles sem fazerem nada
Vão vestindo a sua farda
Como se não tivessem medo

Vão mandando suas bocas
Mostrando suas ideias loucas
para estes e para aqueles

Por isso digo a quem passa
Em Mueda ou no Niassa
Estou mesmo farto deles

Que da guerra não sabem nada
só chateiam a rapaziada
para fazerem um figurão

È descansando
que o tempo vai passando (Ai)
Só estamos esperando
acabar a comissão
--- X ---
(Letra adaptada para o Fado do Cacilheiro de José Viana)
4- Estranha forma de vida

Estranha forma de vida
Estranha comparação
Vive-se em Lourenço Marques
Vive-se em Lourenço Marques
Cá estoura-se o coirão

Vida boa vida airada
Boites é só festança
Lá não se fala em matança
Lá não se fala em matança
Nem em turras à sá morgado

Niassa por onde dança
Guerra como essa ignorada
Conversa que é evitada
Conversa que é evitada
Pelos que vivem na abastança

Falar da nossa desdita
Fica ao lado e aborrece
E como lembrar evita
E como lembrar evita
Toda a gente se entristece

Ao passar pela cidade
Com tanta tranquilidade
Deu-me para comparar

Ao passar pela cidade
com tanta tranquilidade
deu-me para comparar

Meninas de mini-saia
Mandai-as para as nossas praias
Para a manobra de atracar

Meninas de mini-saia
Mandai-as para as nossas praias
Para a manobra de atracar

Pipis com carros “Gts”
Mandai-os para as Berliets
Tirai-lhes as modas finas

Pipis com carros “GTS ”
Mandai-os para as Berliets
Tirai-lhes as modas finas

Menús afeminados
eram bem utilizados
para fazer rebentar minas

Menús afeminados
eram bem utilizados
fazer rebentar minas

Bem como essas tais meninas
Que apesar de enfiesadinhas
Mas com ar da sua graça

Bem como essas tais meninas
Que apesar de enfiezadinhas
Mas com ar da sua graça

Serviam muito a jeito
para salvar a dor de peito
Cá da malta do Niassa

Serviam muito a jeito
Para salvar a dor de peito
Cá da malta do Niassa

Mas se não for só por pirraça
Hão-de lá continuar
E nós temos de lerpar

Mas se não for só por pirraça
Hão-de lá continuar
E nós temos de lerpar

Invertam-se as posições
Troquem-se as situações
Continuamos a aguentar

Invertam-se as posições
Troquem-se as situações
Continuamos a aguentar

Eles os daqui naturais
Gastando dinheiro aos pais
Vão para o Matola Rios

Os daqui naturais
Gastando dinheiro aos pais
Vão para o Matola Rios

Acabe-se com a tradição
Entre-se na mobilização
Utilize-se a manada

Acabe-se com a tradição
Entre-se na mobilização
utilize-se a manada

Dentro de poucas semanas
Como quem come bananas
Estará a guerra acabada

Dentro de poucas semanas
Como quem come bananas
Estará a guerra acabada






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