terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Adelina Valente
Batatas a Pataco

Adelina de Pinho Valente
ex-2ª Comandante da Companhia "Os Magros do capim"



Teria eu os meus 12, 13, 14 anos (não sei bem) mas estaríamos, seguramente, no início ou meados da década de 60.
El Comandante ter-se-ia encontrado na rua com um antigo cantoneiro de Valença que já não via há alguns anos (julgo que se chamava Seixas, nome muito comum naquela região).
Chega ao Quartel muito entusiasmado com a notícia de que tinha encontrado o Seixas e que este lhe teria proposto a venda de batatas a um preço que já não me recordo, mas que pela expressão da 2ª Comandante (Adelina P. Valente), seria ao preço da "uva diurética".
El Comandante, com ar triunfal, declara então ter encomendado dois sacos de batatas e que até já os tinha pago (talvez com receio da subida de preços) e que no dia seguinte as entregariam lá no Quartel.
De imediato, a 2ª Comandante, eu, Carlos e julgo que o Álvaro também, olhamos uns para os outros e ficamos logo ali com a nítida sensação de que: "já foste comido de cebolada!".
A 2ª Comandante, com um sorriso matreiro nos lábios proferiu em surdina uma frase que, traduzida para linguagem actual, seria do tipo: "É que é já a seguir, bem podes esperar sentado!".
Claro que, a partir desse dia, fartamo-nos de "matraquear" a cabeça de El Comandante com a ideia de que tinha sido levado no "conto do vigáro", ao que ele retorquia de imediato com:
- "Oh, oh, o Seixas ia lá fazer uma coisa dessas!"
A partir daí, todos os dias e sempre que chegava ao Quartel para almoçar ou no fim das operações militares do dia, vinha com a pergunta sacramental:
- "Então, as batatas já vieram?".
E dia após dia lá vinha a pergunta e nós sempre a "dar música". Julgo que a cena se repetiu durante, pelo menos, 2 semanas.
Até que, já fartos daquilo e constatando que El Comandante ainda não se convencera de que tinha sido "comido de cebolada", resolvemos, com o conluio da 2ª Comandante, encher um saco de serapilheira com jornais amarrotados e, por cima, todas as batatas que lá havia em casa e que não eram muitas, nem grandes.
Colocamos o saco (só um) ao cimo das escadas de acesso ao Quartel de modo a que ele, ao chegar, desse logo com elas de frente e, à hora prevista da sua chegada, combinamos lugares estratégicos (2ª Comandante incluída) para assistir à reacção de El Comandante.
Eis, então, que se ouvem passos nas escadas!
Cada qual ocupa a posição previamente combinada!
A 2ª Comandante, que se encontrava no Departamento de Alimentação, é avisada!
Os passos são cada vez mais audíveis!
O momento aproxima-se!
Nas "guaritas" o silêncio é total!
Ainda El Comandante não tinha transposto os últimos degraus e, vislumbrando já a parte superior do saco, exclama: - "Ah, vieram, ou não vieram?!" E subindo mais um degrau: - "Só um saco?! O outro também há-de vir!"
Claro que os "observadores", nos seus postos de vigília, começavam a ter dificuldade em conter o riso e a "explosão" deu-se quando, finalmente transpostos todos os degraus, El Comandante se abeira do saco, vê e apalpa as batatas, e afirma com algum desalento: - "Afinal são pequenitas".
A risada é geral, os "observadores" saem das "guaritas", a 2ª Comandante retira-se para o seu Departamento com um sorrisinho cúmplice no rosto, como quem diz:
- "toma e embrulha!"
El Comandante verificando mais abaixo que apenas havia papel, riu-se da "tramóia" e nunca mais perguntou pelas batatas.

Moral da história: El Comandante estava sempre pronto a brincar com tudo e com todos, mas também aceitava com grande "fair play" e com um sorriso nos lábios qualquer partida de que fosse alvo, ainda que daí resultassem prejuízos para a sua pobre carteira.

Abílio Magro






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